Pio
Penna Filho*
Dois países, muito distantes um do outro,
tem chamado a atenção nos últimos dias pelos violentos distúrbios presenciados
em suas respectivas capitais, Kiev e Caracas. Em ambos, amplos setores sociais
estão descontentes com os governos centrais, por diferentes motivos, e tem se
expressado de forma desafiadora ao poder constituído.
A crise na Ucrânia é, pelo menos por
enquanto, muito mais violenta. Não se sabe ao certo quantas pessoas já
morreram, mas alguns dados dispersos indicam que talvez passe de uma centena.
Esse parece ser apenas o começo, uma vez que pelo menos por enquanto não há
indícios de que as partes envolvidas cheguem a um acordo.
Os opositores do governo protestam contra
o que alegam ser o excessivo poder depositado na figura do presidente e querem
também uma aproximação do país com a União Europeia, o que significa uma
espécie de afastamento da Rússia. São questões complicadas.
A limitação do poder presidencial implica
numa reforma constitucional e, naturalmente, o governo não deseja ceder nesse
ponto. Com relação à aproximação com a União Europeia, esse é outro enorme
problema para as autoridades ucranianas, haja vista que existe uma enorme
dependência do país frente à Rússia. Portanto, no fundo não se trata meramente
de uma escolha, senão de uma duvidosa aposta.
É difícil acreditar que a União Europeia esteja
disposta ou em condições de desempenhar o papel que a Rússia cumpre com relação
à Ucrânia. Isso porque a Ucrânia é altamente dependente do gás e de recursos provenientes da Rússia, que vem praticando uma política de amparo
ao governo ucraniano ao permitir sucessivas rolagens de sua dívida. Como se
sabe, a União Europeia já tem problemas demais para administrar com os seus
atuais membros.
Ou seja, os problemas ucranianos não serão
resolvidos por meio de um golpe de estado ou pela mera substituição de um
governo por outro, seja da maneira que for. Com a oposição disposta a ir às
últimas consequências no enfrentamento com o governo, é difícil imaginar uma
saída pacífica para o problema ucraniano.
Na Venezuela o descontentamento com o
chavismo é intenso. A crise econômica que o país vem atravessando há algum
tempo desgastou enormemente o governo e despertou a revolta em alguns setores
da sociedade venezuelana, principalmente entre os jovens, que partiram para as
ruas em tom desafiador.
Agrava o quadro de crise a falta de
habilidade política demonstrada pelo governo do presidente Nicolas Maduro, que
não está sabendo lidar com a crise e com a barulhenta oposição. Além disso,
falta a Maduro o carisma de Hugo Chávez, uma característica importante para um
governante de um país social e politicamente polarizado como é o caso da
Venezuela.
Na Venezuela as perspectivas políticas não
são das melhores, apesar de não se igualarem em termos de radicalização como
vem ocorrendo na Ucrânia. De toda forma, parece que o modelo
chavista-bolivariano está se esgotando e é difícil imaginar que Maduro consiga
se reeleger ou fazer o seu sucessor, e isso se ele conseguir concluir o
mandato.
* Professor do Instituto de Relações Internacionais da
Universidade de Brasília (UnB) e Pesquisador do CNPq. E-mail: piopenna@gmail.com