Pio
Penna Filho*
A tentativa dos Estados Unidos de tentar capturar
a todo custo Edward Snowden, ex-funcionário da CIA, está chegando a um ponto
crítico. O último lance, ocorrido na terça-feira dessa semana, foi a negação de
sobrevoo do avião presidencial da Bolívia sobre os territórios da França,
Itália, Espanha e Portugal, o que forçou a comitiva do presidente Evo Morales a
fazer uma parada não programada na Áustria.
Tal comportamento é inaceitável. Os
europeus, que aliás também foram vigiados e monitorados pelos Estados Unidos,
fizeram um papel muito feio ao colocar sob suspeita o Chefe de um Estado
soberano em retorno de uma viagem oficial à Rússia.
Baseados em rumores, esses Estados
europeus decidiram forçar a descida do avião presidencial boliviano na
esperança de vasculhar a aeronave e reter Snowden para entregá-lo ao governo
norte-americano. Quebraram a cara! As autoridades austríacas informaram
oficialmente que o ex-agente não estava a bordo, aliás, conforme havia, também
oficialmente, sido anunciado previamente pelas autoridades bolivianas.
É curioso o comportamento de alguns
governos da Europa ocidental. Aparentemente não titubeariam em entregar Snowden
a Washington, mesmo sabendo que ele corre o sério risco de ser condenado à
morte por traição nos Estados Unidos. Ou seja, onde fica todo aquele bem
elaborado discurso sobre direitos humanos que os europeus tanto gostam de
apregoar por aí afora?
E mais, as ações de Snowden revelaram uma
das piores facetas da atuação internacional do Estados Unidos, que é a escalada
da vigilância e da espionagem em escala global. Todos que estamos conectados em
rede passamos à condição de suspeitos e de alvos em potencial da espionagem
norte-americana.
Onde está a ética e a moral nesse comportamento?
Qual o lugar do direito a privacidade individual quando a hiperpotência decide
que todos somos suspeitos? E onde isso irá parar? Para que tanta coleta de
dados e informações? Ninguém e nenhum governo fica por aí juntando informações
à toa, tão somente para serem descartadas na sequência.
Comunicado emitido pela presidência da
Unasul, atualmente tendo à frente o Peru, já expressou descontentamento com a
atitude ultrajante dos países europeus que proibiram o sobrevoo e pouso do
avião boliviano por acreditarem nos rumores propagados sabe-se lá por quem. É
inaceitável que um Chefe de Estado seja tratado dessa forma, tendo inclusive a
sua segurança e de toda a sua comitiva, sido colocada em risco por mero boato.
Pelo visto o tempo da arrogância e do
imperialismo não acabou. Ou a comunidade internacional reage e coloca sob
pressão iniciativas autoritárias como essa, ou brevemente retornaremos ao tempo
das trevas, quando prevalece apenas a vontade do mais forte.
* Professor do Instituto de Relações Internacionais da
Universidade de Brasília (UnB) e Pesquisador do CNPq. E-mail: piopenna@gmail.com
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